Por Douglas Barraqui
O futuro nunca dependeu tanto do presente como agora. Embora, já na década de 1960 o meio ambiente tomava seu espaço na agenda política de vários países, em nenhum outro momento os alarmes tocados pelas entidades ligadas ao meio ambiente e por cientistas se fizeram tanto ouvir.As provas empíricas de uma realidade atroz, a de uma crise ambiental em proporções catastróficas, estão por todas as partes, é neste aspecto que as ciências humanas e naturais são desafiadas a provar seu valor e justificar suas eficiências enquanto ramos da produção do conhecimento humano.
Após a segunda Grande Guerra, houve um gradativo crescimento da sociedade de consumo na América do Norte e na Europa, fazendo com que aumentasse a pressão sobre os recursos naturais do planeta; os debates ambientais passam ser calorosos e surgem novos paradigmas. Como uma disciplina na qual seu objeto é o homem, e mais precisamente os homens no tempo [1], a historiografia era desafiada a enfrentar um novo problema, novas abordagens e novas questões. Eis que surge, no âmbito científico e acadêmico Norte Americano, a environmental history (história ambiental): “como um sujeito, é o estudo de como os seres humanos têm relacionado, com mundo natural através do tempo; como um método, é a aplicação de princípios ecológicos para a história” [2]; “sua principal meta é aprofundar nossa compreensão de como os seres humanos têm sido afetados pelo seu ambiente natural através do tempo e, inversamente, como eles têm afetado o ambiente e com que resultados” [3].
O problema epistemológico da história não pode ficar resumido a um problema intelectual e científico, há algo mais além que, agora mais do que nunca, o historiador será provado e terá que enfrentar: um problema cívico e mesmo moral, o historiador tem que prestar contas [4]. É fundamental, portanto, compreender onde se dá a aplicação prática da história ambiental a fim de identificar e dissolver os gargalos que limitam seu espaço de atuação. Para tanto, a iniciativa terá que partir do próprio homem, aquele que não deixa o passado ser esquecido. O historiador terá que engolir qualquer orgulho acadêmico ou de formação teórica, suplantar qualquer forma de “pré-conceito” na troca do saber entre outros ramos da produção do conhecimento e olhar para o meio ambiente – seu meio ambiente – como sua base de existência e o limite do fim da história.
O objetivo em questão é colocar a natureza de volta aos estudos históricos, condicionalmente, explorar as formas pelas quais o mundo biofísico tem influenciado o curso da história da humanidade e as formas, assim como os porquês, que as pessoas têm transformado o seu meio [5]. Na qualidade de pesquisador elenco pontos que, em nossa conjuntura histórica de emergência para uma tomada de ação, são valorosos para o campo da história ambiental: 1) reconhecer a importância e necessidade de um olhar que caminhe pela interdisciplinaridade, promovendo o envolvimento entre as disciplinas, respeitando e reconhecendo suas respectivas fronteiras, caminhando na direção da interação a fim de ampliar o campo de visão da história. 2) fomentar a crescente interação internacional – tendo em vista que as problemáticas referente a meio ambiente tem que ser assistidas por todos os países – das ciências humanas e sociais através da cooperação entre os centros de pesquisas. 3) aproximar os problemas, os resultados e as soluções aos receptores – que não podem ser vistos como passivos do conhecimento alheio – afim de que possam interagir no processo que depende de todos a fim de uma maior consciência ecológica.
Não é mais contra a natureza que devemos lutar – até século XIX as formas e corpos naturais eram encaradas puramente como empecilhos a ocupação humana – mas, sim em sua defesa. A adoção de uma “paradigma de imunidade humana” (human exemptionalism paradigm) aos fatores da natureza, podem ajudar a explicar o motivo da antipatia das ciências sociais – desde suas origens – quanto a um “despertar ecológico” [6]. Seria, portanto, uma ignorância confinar e limitar as ciências sociais às pesquisas básicas e, um crime, em longo prazo ignorar sua contribuição, em um momento em que uma revolução na sensibilidade humana é tão necessária.
Avançar nas concepções das relações homem/natureza constitui uma tarefa difícil, mas de extrema necessidade. A história ambiental não pode ser encarada, portanto, como um mero movimento ambientalista no ceio da historia, um modismo passageiro e, tão pouco como uma história do ambientalismo. Em uma aplicação prática é denuncia pública? Sim, mas é também um ramo de produção do conhecimento com fundamentais reflexões e embates filosóficos e historiográficos. O que está em jogo não é a sobrevivência da história ou um simples esforço para ampliar o campo de narrativa da historiografia, mas sim, a sobrevivência da humanidade e do planeta.
NOTAS:
[1] BLOCH, Marc. Apologia da história ou o ofício do historiador. Rio de Janeiro: J. Zahar, 2002. Pg. 24.
[2] HUGHES, J. Donald. Ecology and Development as Narrative Themes of World History. Environmental History Review 19:1-16 (Spring 1995) Pan's Travail, London, 1994. Pg. 3
[3] WORSTER, Donald. Ed. The Ends of the Earth: Perspectives on Modern Environmental History. Cambridge; New York: CambridgeUniversity Press, 1988. Pg. 290-291.
[4] BLOCH, Marc. Apologia da história ou o ofício do historiador. Rio de Janeiro: J. Zahar, 2002. Pg. 17.
[5] WORSTER, Donald. "Path Across the Levee”, In: The Wealth of Nature. Environmental History and the Ecological Imagination (Oxford, 1993), p. 20.
[6] DRUMMOND, José Augusto. A história ambiental: temas, fontes e linhas de pesquisa. Disponível em: http://www.cpdoc.fgv.br/revista/arq/84.pdf. Acesso em 5 agosto de 2009.
BIBLIOGRAFIAS:
BLOCH, Marc. Apologia da história ou o ofício do historiador. Rio de Janeiro: J. Zahar, 2002.
DRUMMOND, José Augusto. A história ambiental: temas, fontes e linhas de pesquisa. Disponível em: http://www.cpdoc.fgv.br/revista/arq/84.pdf. Acesso em 5 agosto de 2009.
HUGHES, J. Donald. Ecology and Development as Narrative Themes of World History. Environmental History Review 19:1-16 (Spring 1995) Pan's Travail, London, 1994.
WORSTER, Donald. Ed. The Ends of the Earth: Perspectives on Modern Environmental History. Cambridge; New York: CambridgeUniversity Press, 1988.
WORSTER, Donald. "Path Across the Levee”, In: The Wealth of Nature. Environmental History and the Ecological Imagination (Oxford, 1993).
Você também pode ter acesso a este artigo na Rede Brasileira de História Ambiental (RBHA).
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